domingo, 15 de fevereiro de 2009

Obdulio (1993)

Obdulio Varela, el último capitán. Tive o prazer de conhecer o capitão uruguaio da seleção de 50. Sua história e presença de espírito me marcaram. Cheguei a comprar o livro Obdulo, desde el alma, biografia escrita por Antonio Pippo.

Obdulio gostava de beber, se divertir e não ligava para dinheiro. Não pode ser comparado com Garrincha, porém. Estilos e posições diferentes em campo. Em casa, Obdulio contava com o apoio e a fibra de sua mulher, Catalina, que não cansava de denunciar as armações feitas pelos dirigentes. Ela também meteu a mão na massa, com parentes e alguns peões, para construir a casa onde a família ainda morava, após pagar aluguel durante muitos anos.

Fiz várias fotos de Obdulio com a família, mas só encontrei esta nos meus arquivos. Obdulio me comoveu ao contar que depois da conquista da Copa se separou dos companheiros e foi andar pela zona sul do Rio, se não me engano pelo bairro do Flamengo.

Relatou-me que ia passando pela rua e era parabenizado pelos brasileiros. Disse ainda que terminou a noite, bebendo com torcedores do Brasil num bar, triste por ter feito o povo sofrer. Para o biógrafo Pippo declarou que teria feito um gol contra se tivesse que jogar a mesma partida de novo.

Horas depois do Brasil derrotar o Uruguai pelas eliminatórias da Copa de 1994, em Montevidéu, tive a mesma sensação de Obdulio. Saí para comemorar com um jornalista da Folha de São Paulo, após passar minhas matérias. Os uruguaios, ao ouvirem nosso sotaque e palavras, nos paravam e davam parabéns pelo desempenho da seleção brasileira e de Romário. Passei a ter um carinho especial pelos uruguaios.

Conheci Obdulio em 1993, na véspera dele completar 76 anos. Ele morreu pobre - trabalhava num cassino -, aos 78 anos, em 1995. Para ele, uma homenagem através dos versos de Jorge Luis Borges:

"El que acaricia un animal dormido/El que justifica o quiere justificar un mal que le han hecho./El que prefiere que los otros tengan razón./Esas personas, que se ignoran, están salvando al mundo".

Filhos I


Eu, João, meu filho, e David, meu irmão. Roubo uma frase de As memórias do livro, de Geraldine Books, para definir João. Ele é a menina dos meus olhos e a raiz de meu coração

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Dança (20/03/2007)

As músicas iam para um lado , o corpo de Paula para o outro. Mas ela não desistia.

Freqüentou escola de dança, assistiu vários musicais, comprou livros e apostilas. Desenhou até os passos de bolero no chão da sala para obrigar-se a treinar sempre. Mas ainda tropeçava nas próprias pernas.

Criou uma estranha teoria e começou a beber, pois acreditava que o corpo solto podia bailar. Passou a viver de ressaca, com o fígado doente.

Foram tantas as tentativas fracassadas que resolveu pegar os discos e o que lembrava seu infortúnio e fez uma fogueira, onde colocou os pés.

Eles queimaram no ritmo do fogo.

Livro aberto (20/03/2007)

Decidiu escrever sobre si: a história de seu nascimento, o sofrimento com a morte do pai, da mãe, os namoros, as experiências com drogas, a insônia permanente, os dois abortos, o casamento sem amor, a primeira separação – e as que vieram depois.

Tatuou tudo no corpo.

E saiu nua, vagando pelas ruas.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Capa II

Jornais selecionados: The Salt Lake Tribune, San Francisco Chronicle, Las Vegas Sun, The Washington Post, A Tarde (Brasil) and the South Florida Sun-Sentinel.

Dois meses depois do Esso, outra comemoração. Capa feita por mim, Axel Augusto (subeditor de arte), Gil Maciel (editor de infografia), Filipe Cartaxo e Flávia Marinho (infografistas), no dia da posse (20/01/2009) do primeiro presidente negro dos EUA, Barack Obama, foi apontada como uma das mais criativas do mundo por The Poynter Institute. O Poynter é um conceituado instituto de ensino de jornalismo e pesquisas sobre mídia.

Além disso, a capa fará parte de um livro com as melhores 100 primeiras páginas sobre a eleição e posse de Obama. Para saber mais visite os endereços eletrônicos abaixo:

www.gjol.blogspot.com

www.poynter.org/column.asp?id=47&aid=156953

www.atarde.com.br/mundo/noticia.jsf?id=1071100

http://www.masteremjornalismo.org.br/noticia_view.php?id=1848

Capa I - Equipe

Pierre, Vado, Vivas e eu, na cerimônia do Esso

Capa I

No final do ano passado, primeira página do jornal A TARDE, feita por mim, Pierre Themoteo (editor de arte), Vado Alves (subeditor de arte e diagramador da capa) e Fernando Vivas (fotógrafo) foi finalista do Prêmio Esso. Ele foi escolhida como a melhor do Brasil pela comissão de seleção, que reunião 24 executivos dos principais jornais brasileiros, mas na comissão de premiação, com cinco jornalistas veteranos, perdeu para a boa capa de O Dia sobre terremotos.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Flora (17/03/2007)

Flora não ria, não comia e
nem deixava que lhe tocassem para trocar a roupa
Os trapos cobriam seu corpo
desde o dia em que perdera
seus olhos azuis.
A distância das águas geladas
lhe tirou o calor do corpo
e encheu de mágoa o
mar que insistia em brotar
dos seus olhos castanhos, de um mel que perdera o doce do olhar.

Perdera a audição. Renunciara
a ouvir sons, tons, melodias
A escala da pauta musical
era como um calvário, uma dor que crescia junto com o dó.

E as cores do mundo desbotaram.

Ela não se permitia nenhum toque.
Queria guardar no corpo e buscar nas lembranças
o calor dos dedos, o cheiro da pele, o ir e vir dentro de suas cavidades
O amor que lhe escapara.

Perdeu o viço, murchava de dentro pra fora.

E num dia de quase tempestade, se arrastou até o cais
e sentiu o vento que vinha do mar
e teve a ilusao de tê-lo mais uma vez dentro dela.

E as lágrimas secaram.

E não se permitiu mergulhar nas águas geladas que
guardavam seus negros olhos azuis.

Seu corpo foi se despetalando aos poucos
e ela dormiu, tendo a tristeza como sua única
companheira da última viagem.

5h16
17 de março, Cartagena, Colômbia


P.S - Escrevi "José" (abaixo) e minha mulher, Angelina, resolveu escrever "Flora", mostrando o que seria o outro lado de um grande amor que sofre mais do que se consome

José (17/03/2007)

"Qualquer toque traz em si a centelha do desejo" foram as últimas palavras do colombiano José Ortega de Menezes antes de enterrar-se dentro de si. O peito ardia, a cabeça latejava, o corpo todo tremia, quando ele tomou esta decisão.

Não via mais graça no mundo. Parou de comer e abandonou o emprego que adorava. As dores, que tiraram sua alegria, fizeram seus olhos azuis mudar de cor.

Os amigos bem que tentaram ajudá-lo, mas, com o tempo, até os mais persistentes desistiram. José agora vivia prostrado numa imensa cama, transformada em esquife .

Muitos verões se passaram; o sofrimento, não. Começou quando soube que sua doce Flora dançara com um desconhecido numa festa. Não adiantou ela dizer que não fora além disso. Nem oferecer-lhe um belo sorriso.

Um dia, José levantou. Arrancou a sonda do braço, arrastou-se até o cais e jogou-se n' água, transferindo o seu túmulo.

Até hoje, quase um século depois, as criaturas marinhas ainda contam a história do homem que não sabia amar e tinha os olhos mais negros e tristes já vistos no fundo dos oceanos.

Lina (16/03/2007)

Sinto saudades de suas bocas.
E de suas línguas

Sertão de Irará


sábado, 7 de fevereiro de 2009

O homem no píer

África (16/03/2007)

Uma negra imensa, com grandes seios caídos, está nua, sentada na cama. Ela abre os braços, as pernas e um largo sorriso para me receber. Sou atraído por aquele corpo por um ímã poderoso.

Beijo os lábios grossos - minha boca pequena só consegue encostar em um de cada vez –; as carícias aumentam. Toco em suas coxas, sinto calor e umidade em seu sexo. Ela se abre ainda mais e me recebe com volúpia.

Nessa hora, tenho a sensação de conquistar um continente.

Tempero de Angelina para
a receita de Raquel
(09/03/2007)

"O coração apressado para chegar em casa e varar a noite lendo, lendo, lendo..."

A rainha Bárbara

Sob o céu de Itapuã

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A receita de Raquel
(08/03/2007)

"Para você descobrir se deve ou não comprar um livro, a receita é: escolha bem, remexa as estantes, procure novos e velhos autores, analise a capa, leia as primeiras páginas, enamore-se por ele, sem pressa. Revire outras prateleiras, outros assuntos e repita o processo. Selecione dois ou três.

Confira os preços, conte o dinheiro do bolso e veja se você não pode tê-los mais barato em outra loja ou sebo. Analise todas as possibilidade e opte por um, o imprescindível, o mais difícil de ser encontrado, o único da livraria.

Depois, sinta que ele é importante, que você terá um trabalho muito grande para reencontrá-lo, mas certifique-se que não será uma perda definitiva. E devolva-o à estante.

Volte alguns dias depois. Sinta o coração bater mais forte a medida que se aproxima do local do primeiro encontro. Se ele não estiver ali, não desista, procure bem. Não há sensação melhor do que vê-lo no cantinho, meio perdido. Resgate-o.

Tenho certeza que você não vai abandoná-lo nunca".

Gabriela (08/03/2007)

Se eu digo para minha filha "Gabi, eu te amo", estou economizando letras, palavras e sentimentos. Na verdade, eu quero pegá-la no colo, abraçá-la, fazer cafuné nos seus cabelos, rir, brincar, passear de mãos dadas, comprar presentes e viajar com ela, ouvi-la e dar-lhe um demorado beijo.

Ainda assim é pouco.

Deise (06/03/2007)

Na madrugada de 6 de março, muita água desceu do céu. Formado, quem sabe, pela condensação das lágrimas de mães que perderam os filhos nos últimos dias, o toró varreu as ruas da Barra, em Salvador. Choveu tão intensamente, e tão rápido, que mal deu tempo de ver no aguaceiro referência à vida de Deise Ramos Santos.

Negra, pobre, ela se divertia atrás de um trio elétrico ao ser atingida por uma bala perdida. O seu corpo foi enterrado, na Quinta dos Lázaros, 21 anos depois que nasceu; pouco antes do temporal.