sábado, 21 de novembro de 2009

A interferência da emoção

Trabalho em jornais desde 1980 e me transformei em editor em O Dia (RJ) em 1993. Já apurei e acompanhei muitas tragédias, inclusive vividas por jornalistas. Em 1997, por exemplo, testemunhei uma editora de A Notícia, que fazia parte do grupo O Dia, reconhecer na foto de um corpo carbonizado o próprio irmão, um agente da polícia federal morto por traficantes.

A frequência de fatos lastimáveis me fez desenvolver uma espécie de mecanismo de proteção, no qual me distancio ao máximo da tragédia para que a emoção não atrapalhe a realização do trabalho.

Ontem, o sistema de isolamento falhou e editei a primeira página de A TARDE revoltado e muito triste. Explico. No Dia da Consciência Negra, em Salvador, mesmo não sendo feriado, entidades do movimento negro marcham lembrando a morte de Zumbi dos Palmares, reivindicando igualdade racial e protestando contra a violência que dizima os jovens. Ao mesmo tempo, exibem com orgulho suas origens.

Preparava uma página que abria com a manchete sobre os investimentos que a Ford fará no Brasil e na Bahia, a partir da prorrogação por cinco anos da isenção de impostos federais. Isso permite que ela deixe de recolher aos cofres públicos R$ 800 milhões anuais. No final das contas, quem paga para a multinacional crescer somos nós.

Revoltei-me. Ainda mais quando vi a foto da cerimônia em que Lula anunciava as medidas. Só havia brancos no palco. Empresários e políticos, a elite brasileira. Decidi abrir a foto em cinco colunas abaixo da manchete. E sob ela, uma foto maior ainda, mostrando a marcha do movimento negro. Seria uma representação da sociedade.

No entanto, um comentário do designer da 1ª página, Vado Alves, sobre a foto que acabara de entrar na página de Últimas Notícias me chamou a atenção. Ele disse: "Acho que estou ficando velho, não suporto mais ver isso".

Quando olhei para a imagem de um pai que amparava o filho morto por traficantes, desabei. Fiquei sem voz, as lágrimas vieram nos olhos. Detalhe: ele ficou nessa posição por quase cinco horas, esperando o rabecão.

Pouco antes, acabara de ouvir o depoimento da repórter Cleidiana Ramos, na qual ela descrevia que uma líder comunitária e religiosa negra, em discurso na Praça Castro Alves, se dirigiu ao governador Jaques Wagner, pedindo para que se desse um basta ao massacre de jovens vítimas da violência. Lula estava ao lado deles.

Me ocorreu a celeridade para garantir benefícios para a elite não é a mesma para resolver sérios problema, que tem como maioria das vítimas pessoas das classes menos favorecidas.

Lembrei também de meu filho e de como o amo.

E imaginei toda a dor que o pai que acalentava o rapaz morto sofria ali e sofrerá por toda a vida.

Rsolvi mudar a primeira página. Tirei a foto de Lula e da elite empresarial e política, com raiva. Eles não mereceriam o destaque, aparecendo como os bons capitalistas, que se preocupam com o desenvolvimento do País.

Mantive a da marcha da igualdade e a do rapaz morto na periferia. Elas resumiriam melhor a realidade das ruas - acreditei.

Agora, pela manhã, tenho sérias dúvidas se essa foi a decisão correta. Se a a manutenção da foto do presidente que concedia renúncia fiscal para uma multinacional fazer o que deveria ser feito com o dinheiro dela não teria um impacto maior de denúncia.

Só tenho uma certeza: a emoção interferiu no meu trabalho. Interferiu muito.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Dia da Consciência Negra



Vejam como os dois principais jornais da Bahia têm visões diferentes sobre a questão do negro. Essas foram as capas de hoje, no Dia da Consciência Negra.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Bastidores da primeira página

A capa da edição de hoje de A TARDE (19/11) começou a ser concretizada às 20 horas de ontem. À princípio seguiríamos o modelo de uma das 16 templates existentes, na verdade são quatro modelos com pequenas variações sobre o mesmo tema. No entanto, pedi para Vado, meu parceiro e diagramador da primeira página, que desenvolvesse paralelamente a página que eu gostaria de fazer. Quando as duas ficaram prontas, era gritante a diferença em favor da que utilizava tudo que está previsto no projeto gráfico, mas não é contemplado nas páginas pré-fabricadas.

Consultei os editores de Salvador, se eles estariam dispostos a fazer a troca de várias páginas da edição, além de colocar os repórteres para buscarem os dados que estavam faltando. Precisávamos de estatísticas e contar a história do juiz que atropelou e matou um empresário motociclista e que está livre, seguindo a rotina de professor e atuando no fórum, enquanto um motorista de caminhão-caçamba, envolvido em acidente semelhante que resultou na morte de uma estudante, em Itabuna, foi enquadrado em três crimes, sem direito a fiança. Vale lembrar que pela manhã, não havíamos localizado o juiz.

Um repórter, então, mergulhou na internet em buscas de estatísticas. Encontrou os dados mais atualizados de Salvador na página da Transalvador (órgão de trânsito da cidade). Derrubei uma matéria sobre o anúncio de criação de um projeto da área de segurança, ainda longe de concretização, e pedi para que o repórter que a estava fazendo fosse à universidade, onde sabíamos, através do editor de fotografia, que o juiz estava dando aula. Para buscar dados sobre mortes no Brasil, provocadas por acidente de trânsito, recorri à página do Datasus. Depois foi discutir qual seria o número que estaria representado no gráfico da primeira página, com o pessoal da arte.

A corrida contra o tempo animou o fechamento. Tudo ficou pronto em quatro horas. Isto não teria sido possível sem os esforço de Vado Alves (diagramador da 1ª), Carlos Casaes (editor de fotografia), Édson Borges e Luís Lassere (editores de Salvador), Filipe Cartaxo (infografista), Samuel Lima, Flávio Costa, Luísa Torreão (repórteres), Claudionor Santos (fotógrafo), que complementaram o trabalho do pessoal da manhã e da sucursal de Itabuna.

Mais tarde postarei a página do modelo de template para comparação.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Apagão

Depois de um tempo fazendo a primeira só com templates para consolidar a reforma gráfica do jornal, uma pausa para criar. Esta é a edição de A TARDE de 12/11/2009