sábado, 31 de janeiro de 2009

Meus bisavós, minha avó
e a pequena tia-avô

Maria Teresa Teixeira Cardoso Novais, Albino Novais (em pé). Cacilda de Lourdes Novais de Oliveira, minha querida e inesquecível vó, a quem devo o que sou. E a então pequena Dalva Novais. Todos mortos, mas nem tanto, pois os perpetuo.

Mercado em ebulição
15/11/2005

Na primeira semana de existência do vespertino Q!, o que mais chamou atenção no mercado de jornais populares do Rio de Janeiro foi o crescimento das vendas do jornal Meia-Hora. Com isso, acirrou-se a disputa entre O Dia e Extra.

Para quem está chegando agora, uma explicação: O Dia foi o líder do segmento popular no Rio, nas últimas décadas do século passado. Sua liderança, foi arrebatada pelo Extra, criado pelas Organizações Globo para brecar o avanço do concorrente em redutos do jornal O Globo, editado pelo Infoglobo. A estratégia deu certo graças a eficiente propaganda, promoções, apoio das emissoras de rádio e TV do sistema Globo e ao preço do jornal, mais baixo do que o concorrente.

Com queda sistemática de vendas, O Dia lançou um novo produto, o tablóide Meia-Hora, que transita entre a receita padrão de jornais populares, temperada com pitadas de plágio [as cores do logotipo, o conceito de tempo embutido na marca – o "o" da palavra "hora" lembra um relógio, enquanto o "x" do Extra é uma ampulheta estilizada"], a tipologia semelhante e outras pequenas apropriações do concorrente.

Devido a essas semelhanças, foi feita uma pesquisa pelo Infoglobo para medir até que ponto o leitor do seu jornal não o confundia o Extra com o Meia-Hora. O resultado, de acordo com uma fonte da Infoglobo, mostrou que houve uma certa confusão no início, principalmente entre os leitores da classe D, mas que depois a dúvida foi dissipada.

Sábado e domingo - A guerra entre os dois grupos ganha proporção à medida que aumenta a vendagem do Meia-Hora, que não é filiado ao IVC (Instituto Verificador de Circulação). Lançado em setembro, o tablóide completou 41 edições na segunda-feira (14/11). No primeiro dia de vida vendeu cerca de 20 mil jornais, segundo informações de pessoas que fazem o acompanhamento diário de vendagem em banca para o Infoglobo. Na semana anterior, o Meia-Hora atingiu, segundo as mesmas fontes, média diária de 55 mil exemplares, entre segunda e sexta-feira, dias em que circula.

Tanto o Meia-Hora quanto o Q!, no entanto, padecem da falta crônica de anunciantes. Especialistas garantem que mesmo que o Meia-Hora chegue a 200 mil exemplares diários, sem anunciantes ele não se paga. Atribuem a falta de anúncios à desconfiança do mercado, ao fato de o jornal não ser auditado pelo IVC, e à baixa capacidade de consumo dos seus leitores. A desconfiança do mercado também vale para o Q!, que, embora em processo de filiação ao IVC, é um produto muito novo e instável.

Na sede de O Dia circulava outra informação: a média de vendas do Meia-Hora atingira 80 mil jornais/dia. "Menos", disse um funcionário do próprio jornal, acrescentando que esse patamar foi alcançado em duas ocasiões, sem saber informar qual teriam sido as manchetes que possibilitaram essa façanha.

O rápido crescimento, ancorado no preço do jornal (50 centavos de real), fez a direção da empresa cogitar se filiar ao IVC. Outra decisão foi criar as edições de sábado e domingo, que começam a circular no fim de semana de 19 e 20/11. Oito pessoas foram contratadas, aumentando a equipe de redação do Meia-Hora para algo em torno de 30 profissionais. Anunciou-se também a criação de quatro cadernos – um aos sábados ("Casa, reformas e decoração") e três aos domingos ("Saúde", "Esportes" e "Televisão") – que terão entre quatro e oito páginas inicialmente..

Aos domingos, o preço do Meia-Hora será de 1 real. Apesar disso, algumas editorias como a Geral (Polícia e Cidade) e Esportes ainda dependem do material produzido em O Dia. Segundo um editor, 80% do material de Geral do MH é produzido pela equipe outro jornal. As únicas matérias que não são compartilhadas são as exclusivas.

Antenas ligadas - O crescimento do Meia-Hora é visto com cautela pela cúpula do Extra, que aprendeu com os erros cometidos pelo O Dia, em 1997, quando este menosprezou o surgimento do concorrente por acreditar ser possível crescer para cima de O Globo, tomando-lhe leitores e prestígio.

Lembrando esse episódio, funcionário graduado do Extra confirma que a empresa está estudando o novo cenário, "com mais um jogador". Ele admite que se o segmento se mostrar viável, haverá reação, inclusive com a possibilidade de surgir um novo jornal barato.

Com relação a O Dia, propaga-se nas hostes concorrentes que o jornal deixou de vender 4 milhões de exemplares entre fevereiro e setembro. Outro número negativo divulgado pelos concorrentes é que na segunda-feira (14/11), O Dia, pela primeira vez em mais de 20 anos, teria vendido menos do que 100 mil jornais em bancas – perto de 99 mil exemplares, além de cerca de 9 mil assinaturas.

Sob a perspectiva do Extra, o segmento popular está dividido em "popular com conteúdo", no qual ele se inclui, e "popular com pouco valor agregado". Os editores do jornal pretendem continuar a investir em jornalismo investigativo, citando como exemplo as matérias da saga de Dona Vitória, a idosa que filmou traficantes e os denunciou à polícia.
Estratégia de vendas.

Na redação de O Dia, capitaneada por duas das três herdeiras de Ary Carvalho, circula a informação de que o Meia-Hora já está incomodando o Extra. O tablóide teria arrebanhado 11% dos leitores do concorrente, principalmente na classe D.

Um dos editores do jornal revela que a estratégia é deixar o MH passar O Dia, que deve se qualificar ainda mais, mesmo que a vendagem fique abaixo de sua média histórica. O mesmo editor disse que esta decisão estaria fundamentada numa pesquisa, mostrando que o número de leitores do principal jornal do grupo está estabilizado. Especula-se também que a qualquer momento o Extra reagirá. A redução de preço de capa, segundo um editor que pediu para não ser identificado, é menos provável, pois o concorrente cresceu muito e teria prejuízo.

Uma semana de Q! - O Q! completou uma semana de vida com muitos problemas. Foi difícil encontrar o jornal. O sistema de venda de ambulantes em 192 pontos da cidade naufragou na chuva forte que caiu no final da tarde, principalmente nos dois primeiros dias de circulação.
Os ambulantes contratados ficam apenas três horas nos pontos de venda – entre 17h e 20h. Na primeira semana, a moça que trabalha em frente a uma universidade no bairro do Rio Comprido afirmou ter vendido 25 jornais diários, em média. Além dos ambulantes, pouco mais de 100 bancas do Rio se cadastraram para vender o jornal.

O tablóide vespertino, que prometia em outdoors e em spots de rádio trazer notícias mais atualizadas do que os matutinos populares, optou matérias frias, sem impacto, descumprindo a promessa inicial. Não trouxe inovações gráficas nem tecnológicas e luta, sem a força de uma grande mídia, para modificar o hábito arraigado entre fluminenses e cariocas de comprar jornais pela manhã. Outro dado estranho é a proporção editor/página. Incluindo os editores-executivos, são 16 editores para 24 páginas.

Uma iniciativa, porém, merece um registro. O jornal firmou convênio com a Universidade Popular de Comunicação, projeto da ONG Observatório de Favelas, que conta com o apoio da UERJ, UFRJ, UFF, Abraji e Sindicato dos Jornalistas do Rio para formação de comunicadores populares nas favelas. O objetivo é permitir que os alunos do Observatório façam estágio no jornal para se qualificarem e produzir, supervisionados por jornalistas, pautas sobre o cotidiano das comunidades carentes – histórias sobre o aproveitamento e o direito de uso das lajes, o racismo entre negros e nordestinos nas comunidades e uma série de outros assuntos que não são trabalhados a contento na grande imprensa.

Boa iniciativa que não pode ser atrapalhada por repórteres afoitos, que acaso queiram obter informações sobre traficantes de drogas por intermédio desses estudantes.

(*) A capa reproduzida é de 14/03/2008

Tempero brasileiro
para receita espanhola
(01/08/2005)

A guerra dos jornais populares do Rio de Janeiro promete ficar mais renhida nos próximos meses com a entrada em circulação dos jornais Qnotícia – domínio registrado pelas empresas Mídia1 e Pedra da Gávea Online, leia-se Ariane Carvalho e Antônio Jorge Pinheiro – e do novo vespertino que O Dia pretende lançar entre setembro e outubro. [O domínio Quenotícia pertence a uma empresa de informática de Niterói (RJ)].

Além da disputa das irmãs Ariane e Gigi Carvalho (esta, atual presidente de O Dia) pelo segmento, não podemos esquecer que o atual líder do setor, o Extra, do grupo Infoglobo, também pode se movimentar – não é à toa que a empresa acompanha há algum tempo o que acontece no mercado de jornais populares na Europa, mais precisamente na Espanha. Aliás, foram em águas espanholas e em projetos baseados em jornais gratuitos que as duas integrantes da família Carvalho foram beber. Entre eles o ¡Qué! e o 20 Minutos.

O jornal de Ariane é nitidamente baseado no ¡Qué!, inclusive o nome. Tablóide, full-collor, variando de 24 a 36 páginas e voltado para o público jovem, tem como política o incentivo aos blogs em sua edição virtual e o apelo de ser o primeiro jornal espanhol elaborado por seus leitores. Ao criar um blog no portal do jornal, os leitores autorizam os editores a retirar dali material para a publicação, que é distribuída em 13 cidades (7 mil pontos de distribuição) e possui redações em 12 delas.

Já a o novo jornal que O Dia pretende lançar tem semelhanças com o projeto que enviei, a título de colaboração, para a direção de redação do jornal, em fevereiro de 2005. A proposta foi resumida no artigo "De pipocas, sorvetes e jornais", publicado neste Observatório (7/6/2005). Em julho, a idéia repercutiu favoravelmente na revista Imprensa, na coluna do designer Ary Moraes.

O projeto previa o lançamento de edições econômicas mais baratas para que O Dia saísse da incômoda posição de estar espremido entre O Globo e o Extra. Além disso, defendia uma "edição super-econômica de 24 páginas, voltada para os jovens, priorizando o resumo das matérias da semana, o noticiário esportivo e de cultura e lazer. Esta edição seria no formato tablóide e poderia ser oferecido a um preço entre R$ 0,40 e R$ 0,50".

Mais adiante ressalta que estas opções "atrairiam os leitores que contariam com um jornal na medida exata de que precisam, além de ajudar a resolver problemas estratégicos", como uma eventual concorrência com jornais gratuitos, bastando deixar de pela edição mais barata".

Mercado aquecido – O Dia também se baseia na experiência espanhola do jornal 20 Minutos, que pertence a 20 Min Holding, controlada pelo grupo norueguês de comunicação Schibsted. A holding tem presença marcante na Noruega, Suécia, Dinamarca, Suíça, Estônia, Finlândia, França e Espanha, sendo que nos dois últimos países edita jornais gratuitos em seis ou mais cidades. Este jornal é voltado para o público jovem, produtivo, que vive em áreas urbanas. Na Espanha somente 11% da população compram jornais.

Importante ressaltar que tanto a versão tupiniquim do ¡Qué! quanto a nova publicação de O Dia podem ter problemas de consolidação – a opção por um jornal vespertino com resumo de informações do jornal principal, por exemplo, não é garantia de sucesso. Nesse caso, lembro que os jornais têm possibilidade de ganhar sobrevida, transformando-se em jornais gratuitos, bancados exclusivamente por anunciantes. Alguns fatos e comparações permitem esta suposição:

1. O Dia decidiu recentemente parar de distribuir outros jornais, optando apenas por seus próprios produtos. Os executivos da 20 Min Holding afirmam que uma das principais diferenças entre os gratuitos e os outros jornais é a distribuição por canais próprios.

2. Os jornais gratuitos não circulam nos fins de semana, pois a circulação depende de grande movimentação em centros comerciais, universidades, hospitais, clínicas de grande porte, terminais de transporte etc. O Qnotícias já anunciou que circulará apenas nos dias úteis.

3. Os jornais gratuitos se concentram no público jovem. Este grupo, segundo análise de especialistas, não costuma comprar jornais e dificilmente procura outros meios. No entanto, aceita o que lhe é oferecido gratuitamente.

4. A proposta pode atrair investidores estrangeiros, pois que a atual legislação permite a participação deles como sócios minoritários das empresas jornalísticas. Na Espanha, onde a lei é mais flexível, o grupo norueguês se tornou o acionista majoritário da empresa Multiprensa y más, quando os jornais gratuitos da companhia atingiram a tiragem de aproximadamente 300 mil exemplares. Hoje, o segmento gratuito na Espanha tem cerca de 3,5 milhões de leitores.

5. Vale ressaltar que na Europa já surgiram os gratuitos de segunda geração. São publicações voltadas para os segmentos econômico, feminino e de imigrantes. A linhagem começou com gratuitos esportivos.

Independente dos desdobramentos, a disputa pelos leitores fluminenses fará o mercado esquentar ainda mais, caso o Extra – ou até mesmo o esportivo Lance! – seja atingido pelas novas publicações, sejam elas mais baratas que os dois jornais ou gratuitas. No outro extremo, há quem defenda que a disputa entre as irmãs Carvalho pode levar O Dia à ruína.

Aguardemos os próximos rounds.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Saudades
(18/08/2003)

Paulo e Angelina

Patrão, o trem atrasou, por
isso estou chegando agora...*
06/09/2005

(*) Título com verso do samba O trem atrasou, de Paquito, Romeu Gentil, Estanislaw Silva e Artur Vilarinho, para o Carnaval de 1941

A Editora O Dia, responsável pela publicação do jornal O Dia (RJ), anunciou oficialmente, na quarta-feira (31/8), o lançamento de mais um jornal popular, o Meia Hora, nitidamente calcado em projetos bem-sucedidos de veículos impressos gratuitos. No entanto, antes que o anúncio gere expectativas exageradas, é preciso contextualizar e relativizar a iniciativa da empresa.

O Dia há muito perdeu a liderança do setor para o principal concorrente – Extra, pertencente ao Infoglobo, que também edita O Globo. Segundo dados de julho do Instituto Verificador de Circulação (IVC), a média diária de vendas de O Dia, entre segunda-feira e sábado, foi de 137.904 exemplares contra 274.688 do rival. Aos domingos, os números continuaram desfavoráveis: 238.434 contra 428.534.

Em desvantagem neste front, a direção da empresa também vê com preocupação o surgimento de um novo jornal popular, que entrará em circulação nas próximas semanas. O Qnotícias é capitaneado por Ariane Carvalho, que foi alijada do comando de O Dia pelas outras duas herdeiras do empresário Ary Carvalho [ver remissão abaixo].

O Q, como o chamarei daqui para frente, é um clone do jornal espanhol gratuito ¡Qué!. Começou a ser gestado no final de 2004, mas só passou a ser tocado após o carnaval de 2005. A idéia inicial era seguir a estratégia do pioneiro do segmento, o Metro, criado em 1995, na Suécia, e hoje instalado em 19 países da Europa, América do Norte, América do Sul e Ásia: ser distribuído nas principais estações do metrô. No caso do Q, porém, a opção seria pelas estações de trens dos subúrbios cariocas. Conversações com a concessionária do serviço foram iniciadas, mas não teriam evoluído.

Competição – A iminência do surgimento de um novo concorrente, temperada pela disputa entre as irmãs Carvalho, fez O Dia abrir uma nova frente de batalha, antes mesmo de se conseguir obter melhores resultados na guerra que trava com o Extra. Os números de O Dia são menores, por exemplo, na mesma medida em que o jornal leva "furos" sucessivos em áreas consideras estratégicas, como o noticiário policial.

Um exemplo da pressa como a empresa está tocando seus projetos pode ser vista na iniciativa de só registrar o domínio (www.meia-hora.com.br), um dia depois da coletiva que anunciou o produto. A decisão fez com que uma outra empresa fizesse a solicitação do endereço eletrônico um pouco antes. Para garantir o nome da publicação, O Dia solicitou a criação de mais um domínio, dessa vez sem o hífen. A decisão sobre quem ficará com qual endereço será feita pelo comitê de Registro de Domínios para Internet no Brasil.

No passado, mais precisamente no fim dos anos 1980, O Dia obteve sucesso quando ressuscitou A Notícia, marca de sua propriedade, com as características de um jornal popular para impedir o avanço de O Povo, na praça do Rio, que conquistara 50 mil leitores ávidos por fotos escabrosas e um noticiário policialesco, abandonado pelo ex-jornal de Chagas Freitas, então em processo de qualificação. A Notícia recuperou a maioria dos leitores perdidos pelo principal jornal do grupo.
A mesma estratégia foi tentada no final dos anos 1990, quando surgiu o Extra. A Notícia foi reformulada, na tentativa de competir com o popular do Infoglobo, mas acabou sepultada em cova rasa por não ter tido forças para enfrentar a concorrência.

Mercado dinâmico – As movimentações no mercado de mídia impressa do Rio de Janeiro por enquanto estão baseadas em experiências de jornais gratuitos, que a própria Associação Nacional de Jornais começa a defender. Na próxima semana, durante seminário sobre circulação organizado pela entidade, em São Paulo, uma das palestras ministradas por Jim Chisholm, diretor da Associação Mundial de Jornais, será "Jornais gratuitos: uma tendência mundial".
Esse modelo, que ainda não foi implantado em sua plenitude no Brasil, talvez porque os empresários prefiram seguir o exemplo do grupo alemão VG, que optou por criar o jornal com preço de capa baixíssimo "enquanto os gratuitos não chegam", tem desdobramentos surpreendentes.

Em artigo publicado neste Observatório ["Tempero brasileiro para receita espanhola", ver abaixo], ressaltei que já havia uma segunda geração de gratuitos segmentados. No entanto, surgiu algo ainda mais inusitado: os gratuitos customizados.

Em abril de 2005, a companhia de aviação espanhola Iberia lançou o jornal IB Universal, diário tablóide, full-collor, voltado para os 30,5 milhões de passageiros que transporta anualmente. Sua tiragem é de 70 mil exemplares/dia.

Com 24 páginas, divididas em três áreas – "Ahora" (matérias mais importantes e de interesse social) , "Actualidad" (engloba o noticiário de Internacional, Espanha, Economia e Negócios e Esportes) e "Ocio y Espectáculos" (lazer, passatempo, shows, programas e noticiário de TV) –, o jornal da edição de 18 de abril último tinha um quarto de suas páginas preenchidas por anúncios.
Sob a direção do gerente de comunicação da Iberia, o diário foi desenhado pela Cases y Associats, de Barcelona – a mesma empresa que projetou o esportivo Lance! e fez o redesenho gráfico do jornal Estado de S.Paulo e de publicações da Rede Anhangüera de Comunicação).

Assim como qualquer outro subproduto de uma editora de jornais, IB Universal tem uma redação enxuta – aproximadamente 16 pessoas – e contrata os serviços pelos menos três agências de notícias e uma agência de fotos. O diário se propõe a ser um jornal complementar, "ainda que sem dúvida bastará sua leitura para estar bem informado", garante.
As primeiras pesquisas demonstram que 42% dos leitores/passageiros da Ibéria são mulheres, 39% lêem outros jornais, 17,2% são profissionais liberais ou gerentes e a faixa etária de seu público está entre 24 e 54 anos.

Esses dados demonstram que o mercado no Rio pode seguir as mesmas tendências ou resultar em novas experiências, já que pelo menos uma instituição fluminense está analisando a possibilidade de transformar seu jornal mensal num gratuito diário. Se isto se concretizar, veremos que as empresas de comunicação iniciaram o processo com muito mais atraso do que faz supor o nome do novo matutino de O Dia, nitidamente inspirado no 20 minutos, que se espalhou por diversos países europeus.

[O jornal Metro foi concebido com a preocupação de que os leitores consumissem o noticiário no tempo médio de utilização do metrô das principais cidades européias – em torno de 16 minutos. Depois, surgiu o 20 minutos, que levou esta preocupação ao título.]

De pipocas, sorvetes e jornais (*)
(25/06/2005)

A lição que os pipoqueiros já sabem há muito tempo, os donos e diretores de jornais insistem em desprezar: não há como sobreviver oferecendo apenas um tipo de produto em uma única embalagem. Enquanto nas esquinas qualquer consumidor pode escolher entre pipoca doce ou salgada, em pacote grande, médio ou pequeno, continuamos a encontrar nas bancas um único tipo de jornal, com um único preço de capa, sem levar em conta o tamanho do bolso e a vontade do leitor.

Cansei de ouvir amigos cariocas se queixarem de que gostariam de comprar a Folha de S.Paulo aos domingos, mas o jornal é caro para quem só se sente seduzido por um ou outro suplemento. Participei de seminário promovido pelo Sindicato dos Jornalistas e ouvi diretores de jornais do Rio de Janeiro se queixarem da concorrência predatória, da falta de preocupação dos jornalistas com o produto. Enfim, desculpas diversas para justificar a falta de ousadia e criatividade.

Pois bem, insisto, num passeio pela Cinelândia, seguindo o cheiro de bacon, queijo e chocolate com açúcar, pode estar a solução para um dos maiores problemas das empresas jornalísticas: a queda de vendagem. Basta que os diretores e proprietários, assim como os pipoqueiros, ofereçam edições completas, edições econômicas e até edições super-econômicas de nossos diários.

Tomemos como exemplo a edição metropolitana de O Dia (RJ), de 27 de fevereiro de 2005. Feita a conversão das páginas tablóides para o tamanho standard, temos 114 páginas, incluindo três cadernos de noticiário e os suplementos Ataque, Empregos, Automania, Imóveis, Caderno D, Televisão e Classificados. Preço: R$ 2,50 ou R$ 0,02 por página. Quem precisa de tudo isso? Quem lê todas as páginas?

Chicabonzinho - E se, além da edição completa, o jornal oferecesse também uma edição econômica com notícias e entretenimento, incluindo o noticiário, Caderno D, Televisão e Ataque? Seriam 60 páginas por R$ 1,20. Um outro pacote possível englobando notícias e negócios (cadernos que incluem classificados) teria 84 páginas, que poderiam ser arredondadas para R$ 1,70.

Se isto não bastasse, o jornal poderia criar uma edição super-econômica de 24 páginas, voltadas para os jovens, priorizando o resumo das matérias da semana e de domingo, o noticiário esportivo e de cultura e lazer. Esta edição seria no formato tablóide e poderia ser oferecido a um preço entre R$ 0,40 e R$ 0,50.

Estas opções atrairiam os leitores, que contariam com um jornal na medida exata de que precisam, além de ajudar a resolver problemas estratégicos. Por exemplo: caso os jornais gratuitos conseguissem penetrar no mercado brasileiro, o jornal já teria um produto para enfrentar a concorrência, desde que deixasse de cobrar pela edição mais barata.
Para reforçar meu argumento, lembro que nem o sorvete campeão de vendas escapou dessa lógica. Está aí o Chicabonzinho que não me deixa mentir.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

A tática do búfalo
(17/02/2005)

Mauro Gordo é sempre o primeiro a chegar, vestido com sua roupa de gala: o tênis kichute, amarrado como sapatilhas de bailarina; um surrado short preto; e a camisa do Flamengo, cujas cores, adquiridas em dezenas de lavagens, passaram a ser rosa e cinza. Às costas, nenhum número, pois pode se transformar em qualquer jogador que tenha pisado no solo sagrado do Maracanã com o místico manto rubro-negro. Seus dois pares de meiões não combinam com nada – um é verde; o outro, laranja. Não raras vezes utiliza uma meia de cada cor.

Diariamente, Mauro repete o mesmo ritual: a mãe prepara uma mamadeira de café com leite, que ele sorve em um ou dois goles. Na hora da ave-maria, pega a bola dente-de-leite, confere os nós dos cadarços, faz o sinal da cruz e parte em direção ao seu território. Será assim até os seus 20 anos, quando perceber que a maioria dos colegas deixou o bairro.

Nada tira sua concentração enquanto atravessa as ruas Costa Ferreira e Senador Pompeu, nas imediações da Central do Brasil. Fisionomia fechada, a bola debaixo do braço, imagina belas jogadas e como serão os gols que pretende marcar.

Ao chegar no Largo dos Estivadores, verifica a posição dos gelos-baianos do estacionamento que vira campo de futebol todas as noites. Em seguida, abre um largo sorriso e deixa a bola correr. Tem cerca de uma hora, antes da turma chegar, para treinar. Treino básico: embaixadinhas. Sob a luz fraca dos velhos postes do bairro, tenta bater seu recorde. Uma, duas..., a bola foge do controle. De novo e de novo, várias vezes, não consegue passar de três embaixadas com a perna esquerda.

A outra, cega, não serve para nada.

O treino termina quando surgem os primeiros amigos: Banana, Manteiga, Dido, Paulo, Albino, David...Mauro cumprimenta um a um, torcendo para que pouca gente apareça. Paraibinha, Mauro Preto, 32, Sérgio...

- Vam’bora, vam’bora, vamos tirar o time - tenta apressar os outros, sem sucesso.

O sofrimento aumenta a medida que chega mais gente: Lula, Marcos Bu, Celso, Durão, Chope, Jason, Xinha. Já são mais jogadores do que o campo comporta – cinco na linha e um no gol em cada lado.

Longa é o agonia do mais assíduo jogador do Larguinho, que vê a chance de atuar no primeiro racha se apagar.

- Quem quer tirar o time comigo? – insiste.

Quando Banana e Albino, os artilheiros do Águia Dourada, começam a escolha, Mauro Gordo, resignado, puxa de dentro da camisa, preso ao pescoço, um apito de plástico, pronto para virar o juiz. Para quem se acostumou a ser o último selecionado, não é tão ruim apitar e ganhar o direito de comandar o time de fora.

A luz fraca somada à miopia impede a boa atuação do árbitro. Ele é logo expulso. Cabisbaixo, deixa o campo e senta-se na soleira da serraria do seu Gervásio, mudo. Porém, as primeiras gotas de chuva, mudam seu humor.

O primeiro jogo termina vinte minutos depois. Mauro entra com disposição, pega a bola, coloca onde imagina ser o meio do campo. Em seguida, corre para a “banheira”, desprezando a regra do impedimento, sem validade mesmo nas peladas. Os primeiros passes caem teimosamente na perna direita, obrigando-o a fazer uma manobra complicada, que consiste em girar no eixo do próprio corpo, deslocando 110 quilos, na tentativa da perna boa entrar em ação. Por mais que se esforce, demora muito e é desarmado.

Sem jeito, olha para o chão, se prepara para pedir desculpas aos companheiros, mas não dá tempo. Percebe pela algazarra dos adversários que o seu time acaba de levar o primeiro gol.

A chuva aperta, a sarjeta começa a encher. A água já iguala a parte da calçada com a do asfalto, a poeira da rua se transforma em lama. Hora de Mauro colocar em ação a arma secreta. Ele recua até o meio-campo, espera o passe. Domina com o pé esquerdo, baixa a cabeça e, como um búfalo, invade a parte enlameada. É o único a enfrentar o lamaçal sem se preocupar com uma queda, enquanto os inimigos o cercam à distância.

O tiro disparado com violência passa entre os chinelos usados como traves. Gol com direito a comemoração diante de uma torcida imaginária. Mauro age como se fosse um Zico, um Adílio, um Júnior; como se fosse os três ao mesmo tempo.

Antes do jogo recomeçar, puxa do bolso do short uma caderneta e um lápis, embrulhados num plástico. Vai para debaixo da cabine do zelador do estacionamento e registra o tento assinalado ao lado da data da partida. É o controle da artilharia, a prova que já marcou mais de cem gols no Larguinho.

A mesma tática é usada com sucesso pela segunda vez, dando a vitória para a sua equipe. Mauro sai triunfante. Para ele, a batalha acabou.

Em casa, a irmã tenta convencê-lo a tomar um banho antes de dormir, mas o artilheiro está cansado. O corpo desaba na cama e o centroavante dorme, embriagado com o cheiro da lama.

Experiência revolucionária
(15/02/2005)

A vontade de aprender e participar de todas etapas de produção do jornal comunitário O Cidadão (20 mil exemplares mensais) uniu os colaboradores e voluntários do projeto e revolucionou o processo de produção e fechamento da publicação, impressa gratuitamente pela Ediouro e distribuída nas 16 comunidades do Complexo da Maré , no Rio de Janeiro.

No antigo sistema, a equipe, formada por estudantes universitários e moradores da região, enviava matérias para um jornalista profissional e só voltava a reencontrá-las quando o jornal saía da gráfica. No atual, o jornal é elaborado por 21 pessoas da comunidade que dividem os cargos e chefias dos departamentos de redação, publicidade e distribuição.

Hoje também existem três jornalistas – dois deles de O Globo – que os orientam nas reuniões de pauta, na marcação de entrevistas com autoridades e na elaboração dos textos, funcionando como consultores e não mais como editores centralizadores. Nessa experiência, todos saem ganhando.

- Nós ensinamos as técnicas e em contrapartida temos contanto com um universo bem diferente.
do que vivemos. Encontramos pessoas que sofrem com um preconceito muito grande, têm problema de auto-estima, chegam a faltar ao trabalho por causa da violência, mas não se entregam. Lutam contra tudo isso e nos dão uma lição de vida. – afirma Aydano André Motta, redator de O Globo e um dos consultores de O Cidadão.

O novo modelo de parceria também resolveu antigos problemas de periodicidade. Nos quatro últimos meses, conseguiu cumprir os prazos e aumentou o interesse dos comerciantes da Maré.
- A última edição bateu o recorde de anúncios. A regularidade da publicação motivou o comércio local e permitiu que o jornal arrecadasse R$ 1.200 no último mês – comemora Flávia Oliveira, repórter de Economia de O Globo e também consultora de O Cidadão.

História - O Cidadão foi criado em 1999 pelo Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (Ceasm), ONG que visa o desenvolvimento de projetos que permitam aos 130 mil moradores da região a superação das condições de pobreza e exclusão, no Complexo da Maré, área que detém o terceiro pior Índice de Desenvolvimento Humano da cidade.

Segundo Rosilene Matos, atual coordenadora do jornal, ele surgiu com 12 páginas em formato tablóide, após o a Ediouro, editora estabelecida em uma das comunidades do Complexo (Morro do Timbau), concordar em assumir os custos com a impressão da publicação e garantir a qualidade do produto. Além disso, o Ceasm também obteve patrocínio da Petrobrás (em torno de R$ 2.500 mensais) para levar o projeto adiante. A verba da multinacional hoje é utilizada para custar bolsas de R$ 300 para as pessoas que se dedicam em tempo integral ao jornal.

- Quando nosso grupo assumiu, decidimos que todos ganhariam a mesma quantia, independente da função que cada um ocupar – explica Rosilene.

A maior parte dos integrantes de O Cidadão participa ou participou do curso de pré-vestibular para carentes, ministrado pelo Ceasm. Seis deles estão concluindo os cursos de Comunicação, Letras e Pedagogia em universidades públicas (Uerj e UFRJ) ou na PUC-RJ, que oferece bolsas integrais.

Rosilene, que se prepara para fazer vestibular para Comunicação, teve uma motivação extra. Ela participou do Programa de Vocação Científica da Fundação Oswaldo Cruz, que recruta estudantes do 2º grau para desenvolverem projetos nas áreas de Comunicação, Física, Química e Biologia:

- Foi através do Provoc que descobri minha paixão pelo jornalismo. Estou aprendendo muito com a experiência em O Cidadão, que ajuda a mostrar as coisas boas da comunidade, mas pretendo um dia trabalhar na área de jornalismo científico – revela a coordenadora.

O primeiro jornalista a tocar o projeto do Ceasm foi André Esteves. Atualmente, ele desenvolve projetos semelhantes em outras comunidades, sem ser esquecido pela atual equipe de O Cidadão.

- Foi com ele que dei os primeiros passos. Via como ele fazia e tentava fazer parecido – diz Rosilene.

Os atuais consultores também estão conquistando a admiração do grupo. Recentemente, Flávia e Aydano obtiveram ajuda do Instituto Telemar: dois computadores foram doados para a redação, que tinha apenas dois terminais.

Formato - Para facilitar o manuseio dos leitores, O Cidadão passou de tablóide para o formato revista. Também pulou de 12 para 24 páginas, sem alterar o conteúdo. A linha editorial se mantém voltada para problemas comuns a todas as comunidades da Maré. Assuntos como preconceito entre negros e nordestinos (os dois maiores grupos populacionais do Complexo), a questão fundiária, movimentos culturais e a política social do governo Lula são reportagens de capa.

A divulgação das atividades dos grupos que desenvolvem trabalhos sociais na região também é motivo de preocupação permanente. A seção perfil é obrigatória, a cada edição, um ilustre morador como o inspetor do CIEP Samora Machel, Antônio Oliveira; o radialista da rádio comunitária Nova Maré, Sérgio Amorim; e a rezadeira Maria. A História da Maré, baseada em pesquisa feita por dois moradores sobre as mudanças ocorridas na região, é outra seção fixa.

A direção do Ceasm faz questão de realçar no site http://www.ceasm.org.br/ que o “caráter educativo de O Cidadão o transformou em material didático para as instituições de ensino do bairro”. Também chama atenção para o fato de que o jornal “com cores, fotos e textos sem erros de português, o jornal parece até produzido por alguma empresa de comunicação”.

Consultoria - A participação dos consultores Aydano André Motta, Flávia Oliveira e Carla Baiense foi vista, no início, com desconfiança pela equipe de O Cidadão. Isto porque o grupo imaginou que o trio centralizaria as atividades de produção e fechamento do jornal. No entanto, segundo Flávia, após algumas reuniões, chegou-se ao modelo atual. Ela e Aydano colaboram na parte de produção e fechamento; Carla, na elaboração do texto. Eles não são remunerados.

- Sempre defendi uma circulação mais democrática da informação. Acho interessante compartilhar o meu conhecimento, adquirido em 10 anos de O Globo, numa carreira centrada na luta contra as desigualdades sociais. A relação com O Cidadão foi complicada no início, pois havia preconceito dos dois lados. Aos poucos os problemas foram superados e hoje chegamos a conclusão que está é a melhor forma de tocar o projeto – diz Flávia, que acumula vários prêmios em sua carreira.

Flávia também alerta que os jornalistas costumamos reescrever matérias, desenhar páginas, cortar textos com o pé nas costas, mas não se preocupam em ensinar como fazer isto.

- Em O Cidadão passamos a nos preocupar com isto. Nossa rotina consiste em participar da reunião de pauta às segundas-feiras, ter os retornos das matérias por telefone, receber os textos e as páginas por e-mail e sugerir modificações. Depois disso, o material volta para o jornal e a equipe faz o fechamento. Eles aprendem com os próprios erros e acertos – explica a jornalista.

Os consultores lembram que nas primeiras edições, os voluntários colocavam ponto final em legendas e títulos, não sabiam priorizar as informações mais importantes e não tinham noção quanto ao tamanho dos textos – algumas matérias tinham mais de nove laudas.

- Tudo está sendo superado. Além disso, a qualidade do texto deles surpreendeu. Eles escrevem direito – afirma Flávia, que defende a “exportação” da experiência para outras comunidades como forma de democratizar os acessos à informação.

Entusiasmado, Aydano ressalta o potencial econômico do jornal comunitário:

- São 130 mil leitores, pelo menos 60 mil são consumidores de baixa renda. É um mercado para se conhecer. Os empresários esquecem que algumas áreas da cidade como o Saara (Centro) e o Mercado de Madureira movimentam milhares de reais com este tipo de consumidor. É possível uma rede de comunicação nas comunidades carentes, feitas por pessoas da região. A integração dessas áreas permite a melhoria de vida e o combate à criminalidade – defende.

Primeira família

Da esquerda para a Direita - Davi, abraçando meu filho João. Jane, com Lívia no colo. Joana, atrás da bela Gabizim, Ivan e Nica (D. Luzia) e Albino